Fogo de Artifício
"Concedei-nos, Senhor, a Serenidade
necessária
para aceitar as coisas que não podemos
modificar,
Coragem para modificar aquelas que
podemos,
e Sabedoria para distinguir umas das
outras"
modificar,
Coragem para modificar aquelas que
podemos,
e Sabedoria para distinguir umas das
outras"
Seja muito bem-vindo ao blog; Benvindo é meu sobrenome, Anônimo é o meu nome e pública é a minha codependencia.
O bairro era o Morumbi, uma nobre região de classe média alta da cidade de São Paulo; o ano 1997. Estava me sentindo muito mal, no auge da minha doença da emoção, na beira do abismo do desespero. A promessa era algo verdadeiramente extraordinário.
Eu merecia aquilo...
Havia um fogo sagrado — disseram-me —, a grande chama que poderia remover de mim todas as minhas intermináveis dores morais, todos os meus medos, anseios, angústias, frustrações, toda aquela infinita solidão, remover tudo, tudo...
Eu merecia aquilo...
Morava nesta época no interior de São Paulo. Então, em um sábado à tarde, fui até a capital dos paulistanos de carro, tão feliz e cheio de esperança, mais parecia um passarinho saindo de sua gaiola. Viajei 80 quilômetros, viajaria 80.000 se fosse necessário, valeria a pena, voltaria de lá um homem renovado, sem mais nenhum medo da vida, sem depressão, sem desilusão, sem solidão, sem angústia...
Eu merecia aquilo...
A casa onde fui era bonita, grande e luxuosa, uma beleza de residência envolta em verdes jardins — estava no lugar certo. Fui muito bem atendido pela dona da residência, a responsável pelo fogo sagrado, aquela chama maravilhosa acessa a milênios, acho que desde os tempos babilônicos, aquela chama que me libertaria para sempre de todos as minhas misérias morais.
Eu merecia aquilo...
A maga da chama — permitam-me chamá-la assim —, explicou para mim como seria todo o processo. Levou-me para um aposento mais reservado, à meia luz, e disse para mim: Acenderei agora a chama sagrada. Estarei aqui ao seu lado com um pequeno tambor na mão, e quando eu começar a tocar suavemente, quero que você busque dentro de você todas as suas negatividades, verbalize tudo em voz alta, e imagine que todas estas suas dores agora reveladas estarão para sempre queimadas na grande chama sagrada à sua frente. A maga da chama pediu então para que eu me sentasse perto de uma pequena lareira, dando início ao grande milagre.
Eu merecia aquilo...
Então, naquele ano de 1997, sem jamais ter entrado em uma sala de 12 passos, raiado de dor, mergulhado no desespero e na depressão, eu fiz pela primeira vez em minha vida um quarto passo. Ia buscando as emoções, verbalizando, jogando mentalmente na chama e o tambor tocando... buscando as emoções, verbalizando, jogando mentalmente na chama, o tambor tocando e minhas lágrimas descendo...
Eu merecia aquilo...
Minha sinceridade e minha entrega naquele momento era total, aquilo iria resolver tudo, eu tinha fé, eu seria curado. O processo continuava, até que em determinado momento o telefone tocou — os telefones, assim como os tambores, tocam também.
A maga da chama então pediu para que eu continuasse com o processo de queimar minhas dores interiores, continuasse com a catarse. Ali mesmo naquela sala à meia luz ela atendeu ao telefone, e enquanto eu ia buscando as emoções nos meus porões de sofrimento, ela ia tranquilamente jogando conversa ao vento.
Eu não merecia aquilo...
Não sei se quem apagou primeiro foi minha fé naquilo tudo, ou a chama sagrada. Findado o processo, fui convidado a fazer o pagamento. Paguei caro, não sei quanto seria a valores de hoje, mas era caro, muito caro.
Voltei para o interior sob o manto da noite. Escura não estava a estrada, escura estava a minha alma, escura estava a minha revolta, escura estava a minha indignação... eu havia sido enganado naquilo, haviam tripudiado com minha esperança, haviam brincado com minha busca, haviam feito troça de minha fé e de minha dor.
Eu não merecia aquilo...
Escrevo sobre isso somente agora, 22 anos depois. A maga da chama está perdoada, sua ignorância espiritual era tão grande quanto a minha. Fui enganado porque permiti que me enganassem, estava doente, muito doente, doente da alma, eu era um codependente.
Minha chama continua acessa, continuo externando minhas emoções, porém, agora dentro de uma sala de 12 passos. Nestas salas a chama que irradia em mim e através de mim, ilumina minha alma e constrói pontes de solidariedade humana que me ajudam a ir ao outro, daquele companheiro ao meu lado que ainda sofre, ajudando-o a libertar-se também de sua solidão espiritual.
Nestas horas de quarto passo dentro das salas, ouço ainda um leve som, um som bem suave, e não é o som de um tambor... é o Poder Superior dizendo para mim: Continue meu filho, persevere, estou do seu lado e jamais o abandonarei.
Meu nome é Anônimo, não minha dor e minha história, e estou chorando agora... por amor à vida, compartilhe com quem sofre.
Só por hoje serei feliz; só por hoje eu sou a pessoa mais importante da minha vida; 12 Passos de qualquer irmandade: Nós merecemos isso.
Tem uma luz no final do túnel... Amor, perdão, gratidão!
ResponderExcluirMaravilhoso o texto. Só por hoje eu sou a pessoa mais importante da minha vida.
ResponderExcluirMaravilhoso o texto. Só por hoje eu sou a pessoa mais importante da minha vida.
ResponderExcluir